Texto aprovado pela Câmara propõe mudar regra para desistência, que hoje privilegia comprador em detrimento do incorporador

Foi aprovado recentemente pela Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1.220-A/15, que acrescenta dispositivos às leis de incorporações imobiliárias (4.591/64) e de loteamentos (6.766/79) especificamente para regular efeitos da eventual resolução dos contratos envolvendo a aquisição de unidades imobiliárias em construção.

O aprofundamento da crise econômica a partir de 2014 expôs, de forma mais evidente, o desequilíbrio resultante do tratamento dado pela Justiça à matéria: o compromisso de venda e compra de unidades em construção é vinculante para as incorporadoras e loteadoras, mas, de outro lado, não é vinculante para os adquirentes.

A Justiça construiu o conceito de que o adquirente, mesmo sem comprovar o inadimplemento da incorporadora, poderia pretender a rescisão do compromisso e receber a devolução de até 90% dos valores pagos. Já o inadimplemento das incorporadoras (atraso na obra) resultava em devolução integral dos valores pagos, acrescido de multas. A matéria se tornou recorrente na Justiça e muitas incorporadoras estão em situação financeira complicada — em razão do grande volume de desistências dos adquirentes.

O texto do projeto aprovado pela Câmara, que ainda passará por votação no Senado e sanção presidencial, na nossa opinião, apesar de certas falhas de redação — que poderão ser corrigidas até o termino do processo legislativo —, representa um considerável avanço quando, de forma mais equânime, estabelece consequências para a parte que der ensejo à rescisão. Na hipótese de a incorporadora atrasar a entrega do empreendimento (considerando-se atraso apenas após superado o prazo de 180 dias de "carência", praxe adotada pelo mercado, mas que não era regulada pela lei), ela deverá devolver todo o valor pago, acrescido de multa (caso o compromisso seja mantido, haverá incidência de multa "mensal" de 1% sobre os valores pagos). Já na hipótese de o adquirente dar ensejo à rescisão (desistência imotivada ou inadimplemento no pagamento do preço), ele terá direito de receber a devolução do montante pago, deduzida a comissão de corretagem e somada uma multa de 25%.

A multa aplicada ao adquirente pode subir para 50% dos valores pagos se o empreendimento estiver submetido ao patrimônio de afetação. Aparentemente, a elevação da multa nesse caso decorre do reconhecimento, pelo legislador, de que nos empreendimentos submetidos ao regime da afetação os valores pagos pelo adquirente devem ser claramente divididos em preço de aquisição da fração ideal do terreno e pagamento da construção. Assim, o aumento da multa visa preservar o patrimônio afetado e garantir a conclusão da construção — comparecendo o incorporador como espécie de "garantidor" da manutenção do fluxo de aportes da unidade "retomada" em razão da desistência do adquirente.

Nesse sentido, importante destacar que o incorporador seria recompensado com um prazo adicional para a devolução do valor devido de até 30 dias após o habite-se do empreendimento. Neste momento, inclusive, o patrimônio de afetação já estará extinto pela conclusão da obra e aquela unidade poderá ser vendida pelo incorporador, que ficará integralmente com os resultados da revenda.

Outro acerto da redação aprovada pela Câmara é a distinção de tratamento que deverá ser dada à rescisão quando o negócio estiver atrelado à estrutura de alienação fiduciária. Nesses casos, as obrigações envolvendo devolução de recursos devem seguir o que já consta da legislação específica dessa modalidade de negócio.

Ainda que o projeto seja provavelmente objeto de discussões e debates até a sua efetiva (e eventual) aprovação, entendemos que a vigência das regras como propostas abrirá uma nova fase na relação entre as empresas imobiliárias e os adquirentes de unidades em construção, na qual prevalecerá, de forma mais efetiva, a seriedade das avenças e o cumprimento dos compromissos.

19 de Junho de 2018

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