Ministro do STJ concedeu habeas corpus para trancar ação penal proposta pelo Ministério Público; leia essa e outras notícias na newsletter de Direito Penal Empresarial

Nessa newsletter de Direito Penal Empresarial, você vai encontrar as seguintes notícias:

  • MP não pode requisitar dados com base em suspeita de falhas na comunicação de ilícitos tributários pela Receita
  • MPF, CGU e AGU deverão estabelecer consenso sobre acordos de leniência em 60 dias
  • Ministro suspende julgamento de ampliação do foro por prerrogativa de função

MP não pode requisitar dados com base em suspeita de falhas na comunicação de ilícitos tributários pela Receita

O ministro Ribeiro Dantas, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu ordem de Habeas Corpus para trancar ação penal proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) contra um empresário acusado de sonegação de tributos (art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90) e contribuições previdenciárias (art. 337-A, incisos I e III, do Código Penal), por irregularidades no procedimento adotado pelo MPF para obtenção de dados sigilosos.

No caso, a Justiça Federal do Espírito Santo rejeitou a denúncia oferecida pelo MPF com base no art. 395, inciso III do Código de Processo Penal, por entender que o conjunto de elementos trazidos na denúncia derivaria de relatórios e declarações fiscais sigilosas, obtidos “de maneira desconforme ao regramento legal”, pois a Receita Federal não teria encaminhado Representação Fiscal para Fins Penais (RFFP) ao MPF.

Ao contrário, o MPF teria requisitado diretamente cópias de procedimentos administrativos fiscais e documentos sigilosos sem que a Receita Federal tivesse suscitado a existência de indícios de eventuais crimes tributários. De forma genérica, suspeitando de que a Receita Federal estaria omitindo a formalização de representações fiscais para fins penais, o MPF requisitou uma planilha relativa aos procedimentos administrativos fiscais com informações como (i) tributos exigidos, (ii) valor do crédito tributário lançado, (iii) motivo do lançamento etc.

Após recurso do MPF, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região reformou a decisão de primeiro grau para receber a denúncia, sob o fundamento de que “o procedimento administrativo fiscal- documento que respalda todas as Representações Fiscais para Fins Penais já deveria ter sido encaminhado pela Receita Federal ao MPF, o que demonstra ser lícito o encaminhamento do PAF, com fulcro no art. 198, §§ 2º e 3º do CTN e art.8º, § 2º da LC 75/93” e que “(…) a requisição não foi realizada sem fundamento, nem de dados sigilosos de qualquer pessoa, mas sim de compartilhamento de dados colhidos, de forma regular, no curso de PAF (…)”.

No julgamento do Habeas Corpus nº 868.425, todavia, o ministro Ribeiro Dantas reafirmou o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que “[a] possibilidade de a Receita Federal valer-se da representação fiscal para fins penais, a fim de encaminhar, de ofício, os dados coletados no âmbito do procedimento administrativo fiscal, quando identificada a existência de indícios da prática de crime, ao Ministério Público, para fins de persecução criminal, não autoriza o órgão da acusação a requisitar diretamente esses mesmos dados sem autorização judicial.”.

No julgamento, o ministro ressaltou que a conduta do MPF “(…) acabou por mitigar o sigilo dos dados fiscais do contribuinte sem o amparo legal, o que torna a prova colhida diretamente ilícita”. Em outras palavras, a possibilidade de compartilhamento por iniciativa da Receita Federal, quando presentes indícios da prática de crimes, não autoriza que o próprio MPF requisite dados sigilosos diretamente, sem provocação da Receita Feral e sem autorização judicial.

Por fim, o ministro reafirmou que o procedimento adequado para o compartilhamento de informações fiscais, além da devida autorização judicial, estaria embasado na solicitação, pelo MPF, de informações genéricas sobre autuações realizadas pela Receita Federal, sem acesso direto a dados sigilosos dos contribuintes, para verificação de eventuais falhas na comunicação de crimes contra a ordem tributária.

MPF, CGU e AGU deverão estabelecer consenso sobre acordos de leniência em 60 dias

Em audiência realizada em 26 de fevereiro de 2024 no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1.051, o Ministro André Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu prazo de 60 dias para que o Ministério Público Federal (MPF), a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Advocacia-Geral da União (AGU) estabeleçam um consenso sobre os acordos de leniência e tratativas de renegociação em relação aos acordos firmados por empresas investigadas na Operação Lava-Jato.

No caso, três partidos políticos ajuizaram ADPF no Supremo Tribunal Federal para: (i) suspender liminarmente as multas e indenizações impostas em todos os acordos de leniência celebrados com empresas investigadas pela Operação Lava-Jato, (ii) obter do STF a fixação de interpretação conforme a Constituição da Lei nº 12.846/2013 e do Decreto nº 11.129/2022, garantindo a presença, no âmbito federal, da CGU como proponente ou órgão de controle para a celebração de acordos desse gênero, (iii) reconhecer, em sede de jurisdição constitucional, que os acordos de leniência foram pactuados em situação de extrema anormalidade político-jurídico-institucional, mediante situação de coação e, portanto, sob um Estado de Coisas Inconstitucional (ECI), e, por fim, (iv) possibilitar a revisão de tais acordos à luz dos critérios a serem fixados pelo Supremo Tribunal Federal mediante julgamento da ADPF.

Nesse contexto, é enfatizado na ADPF que os acordos de leniência anteriores ao Acordo de Cooperação Técnica em matéria de combate à corrupção no Brasil (ACT), celebrado em 06.08.2020, conteriam diversas ilicitudes, como coação, arbitrariedade na criação de instituto inexistente no ordenamento jurídico denominado “multa híbrida” (multa e ressarcimento mínimo ao erário), abusos na identificação da base de cálculo das multas, celebração de múltiplos acordos de leniência, entre outros.

Segundo os partidos políticos, essas ilicitudes teriam ocorrido porque “[n]o âmbito federal, a Lei Anticorrupção atribui à CGU a competência para a celebração dos acordos de leniência, mas o Ministério Público, em especial o Ministério Público Federal (no âmbito da Lava Jato), aproveitando-se de sua condição de monopolista da ação penal e de sua competência para o ajuizamento da ação de improbidade, exerceu um magnetismo irresistível, de modo a atrair para si, ao menos nos primeiros anos, a esmagadora maioria dos acordos”.

O Relator do caso, Ministro André Mendonça, considerou que a temática de fundo da ADPF seria (i) a legitimidade ou não dos acordos de leniência celebrados anteriormente ao ACT, (ii) qual a instituição federal com competência para negociá-los e (iii) a possível existência de vícios nesses acordos. Com essas considerações, o Ministro reputou propícia a tentativa de solução consensual com a participação das instituições públicas com corpo técnico adequado para fornecer dados técnicos, determinando a tentativa de diálogo entre os envolvidos para “construção de potenciais convergências de entendimento em relação ao problema a ser enfrentado”, mediante a tentativa de autocomposição por meio de audiência de conciliação.

Na audiência designada – que contou com a participação da PGR, AGU, CGU, os partidos políticos que ajuizaram a ADPF, as empresas que firmaram acordos de leniência com as instituições acima referidas antes da celebração do ACT e, por fim, do TCU -, foi concedido o prazo de 60 dias para que o MPF, CGU e AGU cheguem a um consenso sobre os acordos de leniência e tratativas de renegociação existentes em relação aos acordos firmados pelas empresas que se habilitaram na ADPF.

Com a determinação do Ministro André Mendonça, fica suspensa a aplicabilidade de qualquer medida sancionatória às empresas participantes do processo em razão de eventual demora no adimplemento das obrigações financeiras até então assumidas. Com o vencimento do prazo estipulado pelo Ministro, o MPF, a CGU e a AGU deverão apresentar o resultado das tratativas para deliberação sobre a validade do que for convencionado após manifestação da Procuradoria-Geral da União (PGR) e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Ministro suspende julgamento de ampliação do foro por prerrogativa de função

O Supremo Tribunal Federal (STF) está julgando Habeas Corpus que discute alterações em relação ao entendimento fixado anteriormente sobre o foro por prerrogativa de função.

Até então, o STF havia fixado entendimento no julgamento de questão de ordem no âmbito da Ação Penal nº 907 de que o foro por prerrogativa de função seria aplicável apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. Nesse sentido, fixou-se o seguinte entendimento “(i) O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas; e (ii) Após o final da instrução processual, com a publicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo”.

No Habeas Corpus nº 232.627, cujo julgamento foi afetado para análise do plenário do STF pelo relator, ministro Gilmar Mendes, foi proposta a revisitação do tema para definir, a princípio, a seguinte tese: “a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”.

No caso concreto, o paciente do Habeas Corpus impetrado no STF era deputado federal investigado pela prática de “rachadinha” – conduta de exigir um percentual da remuneração dos servidores comissionados que trabalhavam em seu gabinete na Câmara dos Deputados -, durante as legislaturas de 2007/2011 e 2011/2015, em troca da manutenção dos cargos ocupados.

O inquérito policial foi instaurado em 2013 no STF e, em 2015, o então Deputado Federal assumiu o cargo de Vice-Governador do Estado do Pará, o que motivou a remessa da investigação ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). Posteriormente, o caso foi remetido à Justiça Federal do Pará e a defesa se insurgiu alegando que o paciente estava prestes a assumir o cargo de Senador da República, sendo necessária a remessa ao STF. Após uma série de recursos e ações autônomas discutindo a competência em razão do local dos fatos e o foro por prerrogativa de função, o caso chegou ao STF para análise do Ministro Gilmar Mendes, que afetou o julgamento ao plenário da corte e propôs a revisitação do entendimento sobre o tema.

Atualmente, quatro Ministros já votaram para conceder o Habeas Corpus e acompanhar o Relator Gilmar Mendes na fixação da tese de que “a prerrogativa de foro para julgamento de crimes praticados no cargo e em razão das funções subsiste mesmo após o afastamento do cargo, ainda que o inquérito ou a ação penal sejam iniciados depois de cessado seu exercício”, e o Ministro Flavio Dino acrescentou um novo item à tese no sentido de que “[e]m qualquer hipótese de foro por prerrogativa de função, não haverá alteração de competência com a investidura em outro cargo público, ou a sua perda, prevalecendo o foro cabível no momento da instauração da investigação pelo Tribunal competente”.

The content of this article is intended to provide a general guide to the subject matter. Specialist advice should be sought about your specific circumstances.