Pensando no Dia dos Povos Indígenas, celebrado no dia 19/04, vale comentar a respeito da participação dos povos originários sob o prisma do eixo social do ESG. Quem lida com empreendimentos ou atividades que geram impactos nessas comunidades já conhece o tema de longa data, uma vez que o licenciamento ambiental deve incorporar o seu consentimento livre, prévio e informado para concessão da licença.

Porém, no contexto ESG, a participação de grupos minoritários deve ser vista para além de uma formalidade a ser atendida para obtenção da licença ambiental e incorporada ao propósito da empresa e sua forma de fazer negócios, para os quais o relacionamento com a comunidade diretamente impactada é relevante em termos de licença social, justiça ambiental, imagem e reputação.

Um dos principais instrumentos que disciplinam o tema é a Convenção n.º 169 da Organização Internacional do Trabalho ("OIT"), de 1989. Ela foi incorporada ao Direito brasileiro em 2004, pelo Decreto Federal n.º 8.772 e segue atual e relevante para todas as discussões envolvendo o eixo social do ESG. Isto porque, em resumo, a Convenção diz respeito à consulta e à participação dos povos originários e ao dever do Estado de assegurá-las.

Existe um debate sobre a natureza da participação dos povos originários no processo de licenciamento ambiental, se seria de fato necessário um "consentimento", ou seja, se é imprescindível a concordância da comunidade para instalação da atividade ou empreendimento, ou se bastaria uma "consulta", que não vinculasse a decisão da comunidade à sua implementação. A discussão sobre interpretação sistemática da legislação ainda existe no plano estritamente jurídico, mas do ponto de vista do ESG, é um ponto superado: instalar um empreendimento ou atividade sem debatê-lo com a comunidade impactada, especialmente povos originários, não é uma prática recomendada e, para além dos riscos reputacionais, pode tornar a empresa alvo que ações judiciais sobre o tema.

Na prática, algumas dicas podem auxiliar na elaboração de protocolos de participação social de povos originários e outros grupos em situação de vulnerabilidade para que o atendimento da norma extravase a questão da mera conformidade legal e agregue impacto positivo para essas comunidades:

  • Atuação em longo prazo, com a instituição de grupo de trabalho para interlocução com a comunidade de forma empática, transparente e com linguagem acessível, para expor, ouvir e construir soluções para os eventuais os impactos negativos da implantação e operação do empreendimento ou atividade;
  • O estabelecimento do calendário de encontros e reuniões deve respeitar as datas festivas e religiosas da comunidade e o seu processo decisório coletivo, adaptando-se ao tempo necessário para essa tomada de decisão;
  • Disponibilização de meio de transporte (vans, micro-ônibus, etc.) para que os membros da comunidade possam se deslocar até o local das reuniões, especialmente suas lideranças;
  • Em termos de governança, instituição de protocolos internos para que as reivindicações das comunidades sejam levadas às gerências e diretorias tomadoras de decisão;
  • Ainda em termos de governança, instituição de processos com prazos para assegurar à comunidade respostas de qualidade às suas reinvindicações.

É verdade que, diante da multiplicidade de atores envolvidos no processo, a formação de um consenso é pouco provável. Porém, a deliberação de ideias, pontos de vista e posicionamentos no curso do processo da tomada de decisão é mais importante que a decisão em si. Graham Smith, estudioso do tema, afirma, com base em dados empíricos, que em processos de decisão onde exista diálogo inclusivo, os atores tendem a aceitar com mais boa vontade uma decisão, ainda que contrária a seus interesses. Isso porque, desde que haja um diálogo efetivo, os atores contrariados se sentirão parte da decisão tomada, o que faz dela mais legítima.

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