O uso de combustível fóssil corresponde a mais da metade das emissões globais de gases de efeito estufa e ocupa o centro do debate em torno da chamada "descarbonização" da economia. O esforço, segundo analistas, depende das pressões de mercado, dos custos das tecnologias limpas e de quanto o mundo está disposto a investir contra riscos do aquecimento global – cenário que coloca o petróleo, acima do carvão e do gás, como fiel da balança no caso de uma mitigação climática mais ambiciosa e próxima dos níveis seguros.

"Sob o ponto de vista tecnológico, o petróleo tem usos para os quais ainda não há substitutos à altura, mas precisará achar novos caminhos de produção e refino, com menor queima para gerar energia, se a urgência da redução de carbono aumentar", diz Alexandre Szklo, professor de planejamento energético da Coppe/UFRJ.

No atual quadro da ambição global, resumida basicamente à substituição de carvão mineral, a perspectiva é de o aumento da temperatura atingir 3,5º C até 2100. Para limitá-lo a 1,5º C, como preconiza o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), "a questão se torna mais dramática e exigirá antecipar tecnologias alternativas no transporte de carga, aviação e uso não energético do petróleo", diz.

Para muitos pesquisadores, a redução da queima de petróleo no médio-longo prazo é o que pode fazer a diferença de escala no processo de descarbonização da economia, embora a motivação nem sempre seja a questão climática. "A tendência dos veículos elétricos, por exemplo, com efeitos sobre a gasolina, é hoje mais uma demanda econômica, de mobilidade urbana e de redução da poluição do ar", afirma o pesquisador.

Além dos riscos de desastres ambientais, como vazamentos no mar, o petróleo impacta a saúde via poluentes liberados na combustão. No mundo, a poluição do ar causa 7 milhões de mortes a cada ano e exige cerca de US$ 5,11 trilhões em gastos com bem-estar, segundo recente estudo da ONU.

A redução de mercado energético para o petróleo tem como contraponto a expansão do refino para usos mais nobres na indústria química, em que o carbono fica aprisionado na forma de produtos. "Dentro de uma estratégia abrangente, que resolva o impacto dos resíduos do consumo, o petróleo pode ser visto como parte da solução: entre 2003 e 2013, foram evitadas 126 milhões de toneladas de carbono graças ao uso do plástico na indústria automobilística", diz Jorge Soto, diretor de desenvolvimento sustentável da Braskem, uma das maiores produtoras de resinas plásticas do mundo.

"O capital joga conforme a dança e sem regulamentações e políticas de governo será difícil atingirmos a escala necessária de mudanças", diz Paulo Branco, vice-coordenador do Centro de Estudos em Sustentabilidade, da Fundação Getulio Vargas. Neste caso, para ele, "a geoquímica e a força da natureza sob o impacto climático – e não a economia – é o que provocará as transformações".

Para Guarany Osório, coordenador de política e economia ambiental na instituição, "é mais barato mudar agora do que assumir o alto custo dos riscos no futuro". No entanto, diz, "as evidências científicas, ao que tudo indica, se mostram insuficientes: se acreditássemos nelas, já estaríamos fazendo mais".

"A questão requer visão de longo prazo, porque a mudança não será disruptiva", avalia Lauro Martins, diretor executivo do Carbon Disclosure Project (CDP), organismo que reúne 650 investidores com carteira total de US$ 87 trilhões. O mundo desembolsou US$ 373 bilhões em subsídios a combustíveis fósseis em 2015, segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Por mais de três décadas, a participação das fontes sujas na demanda global de energia se mantém estável em 81%.

Fonte: Valor

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