No passado dia 3 de março, foi publicada em Diário da República a Lei n.º 8/2017 que vem estabelecer um novo estatuto jurídico para os animais.

Até agora, no plano jurídico-civil, os animais eram tratados como "coisas", submetidos ao mesmo tratamento dos objetos inanimados.

Este novo estatuto jurídico dos animais, através do qual se reconhece a estes a natureza de seres vivos dotados de sensibilidade, passando assim a ter um estatuto próprio, leva a que os mesmos adquiram uma qualificação intermédia "entre a coisa e o ser humano". A alteração legislativa levou também à criação de um novo subtítulo ao título II do livro I do Código Civil Português, com a denominação «Dos animais».

No que concerne às alterações e aditamentos propriamente ditos, podem ser assinalados, entre outros, os seguintes:

  • Nos termos do artigo 201.º-B, os animais são definidos como "seres vivos dotados de sensibilidade" objeto de proteção jurídica, ganhando assim autonomia jurídica face a seres humanos e coisas;
  • De acordo com o artigo 493.º-A, o responsável pela lesão ou morte de um animal será obrigado a indemnizar o proprietário deste, ou quem tenha socorrido o animal, pelas despesas em que tenha incorrido para o respetivo tratamento. Esta indemnização é devida, ainda que o valor das despesas resulte mais elevado que o valor patrimonial atribuído ao animal.

Esta particularidade é consequência do distanciamento do tratamento jurídico que agora se dá aos animais, por comparação ao que anteriormente se dava, estabelecendo uma distinção clara entre o "animal - coisa" e o "animal - ser vivo dotado de sensibilidade" objeto desta nova proteção jurídica de que é alvo. Embora não se defina o que são animais de companhia, prevê-se no n.º 3 deste artigo uma indemnização adequada pelo desgosto ou sofrimento moral, nos casos de lesão de animais de companhia, da qual resulte a morte, privação de importante órgão ou membro, ou a afetação grave e permanente da capacidade de locomoção destes.

  • Nos termos do artigo 1305.º-A, os proprietários dos animais devem assegurar o bem-estar e respeitar as características das diferentes espécies, garantindo acesso a água, alimentação e acesso a cuidados médico-veterinários.
  • No plano das relações patrimoniais entre os cônjuges, por força da redação dada ao artigo 1793.º-A, estipula-se que os animais de companhia não integram a comunhão geral de bens, determinando-se também a necessidade de regulação do destino dos animais de companhia em caso de divórcio, considerando, nomeadamente, os interesses de cada um dos cônjuges, dos filhos do casal e do bem-estar do animal.
  • Por último, de acordo com o disposto no artigo 201.º-D, é estabelecido o como regime subsidiário aplicável aos animais, as disposições relativas às coisas, o que nos parece que poderá ser considerado como algo contraditório, tendo em conta que a alteração legislativa pretendeu exatamente afastar a classificação do animal como coisa.

Estas alterações legislativas resultam da necessidade de adoção de medidas vocacionadas para a proteção e salvaguarda dos animais, face a atos de crueldade e maus-tratos pelos seus donos ou por terceiros. Vêm no seguimento da evolução das ordens jurídicas de diversos estados europeus, tais como a alemã, a austríaca e a francesa, sendo também previsto no artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia que, na aplicação das políticas da união, devem ser ponderadas as exigências em matéria de bem-estar dos animais enquanto seres sencientes.

Apesar de alteração legislativa ser de louvar, com a proteção do estatuto dos animais face ao que tinham anteriormente, cremos que ficam algumas questões por responder e que talvez devessem ter sido contempladas pelo legislador, tal como uma definição para animal de companhia e a sua distinção em relação aos restantes animais, e saber como se rege o direito de propriedade sobre os animais, designadamente, se será lícito renunciar a tal direito.

Estas alterações entram em vigor no próximo dia 1 de maio de 2017.

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